terça-feira, 31 de julho de 2012

O maior momento do esporte

É tempo de Olimpíadas, é tempo de inspiração!
Vivenciamos novamente o maior momento do esporte mundial. Não, não me refiro ao Campeonato de Canastra realizado anualmente no meu bairro. Tampouco me aludo ao Torneio de Bocha do bar que meu sogro frequenta para a prática desta modalidade que exige o máximo de concentração, habilidade e cachaça. Não. É tempo de Olimpíadas, meus caros!

As Olimpíadas surgiram há muito, muito tempo, antes mesmo de Cristo, pouco depois do nascimento de Niemeyer. Uma dificuldade. Primeiro porque, naquela época, faltava tecnologia. As sandálias gregas não contavam com sistemas de absorção de impactos, o que poderia compensar em partes a falta de asfalto para as maratonas daquele tempo e, talvez até, impedir a morte de Filípides. Há indícios de que os energéticos a base de taurina também não haviam sido inventados. Mas sempre houve dúvidas: Ícaro parece ter bebido alguma coisa que lhe deu asas.

Antigamente os atletas saíam de suas casas para suar a camisa motivados não pelas grandes premiações em dinheiro - sequer inventado -, mas pelo status de ser quem eram e o consequente reconhecimento público. É quase como os jornalistas atualmente, num exemplo moderno. O único prêmio era possuir a coroa. E nada de imaginar uma noite de amor com a Elizabeth da época. Não: a recompensa pelo esforço estafante era tão somente a auréola de louros concedida aos vencedores.

Hoje tudo mudou. Não há mais corrida de bigas, não há mais cabos de guerras, não há mais lançamentos de pedras. Os heróis do passado foram substituídos por homens e mulheres competindo no ar-condicionado. Menos emoção, menor glória? Nada. As condições de trabalho melhoraram para que estes atletas chegassem ao limite do corpo humano sem doping. Recordes antigos são dinamitados. Números que jamais farão sentido para você ou eu, que pedimos clemência ao subir três andares de escada. Novos ídolos nascem. Olímpia vive, agora em Londres.

Não há quem resista a uma olhadela nas Olimpíadas. Fora os guardas felpudos, seres empalhados pela própria rainha inglesa, ninguém fica indiferente aos jogos. Tenho visto tudo o que posso. De competições consagradas como o tiro ao prato até esportes de pouco público, como o futebol. Contagia. Quase comecei a academia esta semana. Desliguei a TV antes deste mal. É bom tomar cuidado: soube que a rainha Elizabeth se atirou de um avião com o James Bond só pra ver a pira olímpica. E que pira.

A capital do mundo agora é Londres, então welcome a você - sem duplos sentidos porque aqui não se faz piada velha. Viva o clima londrino. Ouça Beatles. Ande pela contramão. Odeie o príncipe Charles. Não tome banho - sei lá, a França é ali perto. Dance os cem metros rasos no seu quadrado. Tome chá às cinco. Case com a Kate Middleton - o.k., não se pode ter tudo. Mas, se não puder nada disto, apenas faça o seguinte: pratique esporte. Just do it. O legado máximo de qualquer Olimpíada é a motivação para uma vida saudável e a busca pela superação de obstáculos. Ouse. Mexa-se. Faça qualquer coisa. Nem que seja a bocha.


PS: Agora, com vocês, Queen:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 31 de julho de 2012.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Eu tenho medo


Ops! Acho que vi o Velho do Saco...
Sou obrigado a confessar: tenho medo. Aliás, medos. Mas não que eu seja um simples medroso qualquer. Não, nada disto. Sou um legítimo Cagão, com maiúsculo e sem músculo. Também não pense que é fácil, para mim, falar abertamente sobre aquilo que me assombra – já que tais informações podem ser usadas contra a minha pessoa em uma ocasião futura. Torço, contudo, para que ninguém utilize este texto para me fazer mal. E, pra ser honesto, não acredito que algum leitor leve adiante possibilidades como a de me enterrar vivo com o único intuito de dar um cagaço – primeira apreensão que entrego.

Dizem que sentir medo faz bem. O pavor seria uma espécie de bloqueio natural a ideias malucas que às vezes todo mundo tem. Como pular de algum lugar bem alto achando que é possível flutuar durante a queda com o guarda-chuva aberto. Tolice. Qualquer idiota sabe que isto só funciona com o guarda-sol. E se você não for o André Marques. Pois bem, dizem que até os mais bravos guerreiros sentiam temores durante a guerra. A diferença é que os covardes fugiam ao primeiro sinal de pavor, enquanto que os ladinos ficavam para morrer. Acho digno: nada mais nobre do que uma homenagem póstuma – a não ser que seja na Assembleia Legislativa, é claro.

Algumas apreensões são comuns a todas as pessoas, penso eu. Como o receio de perder os pais, por exemplo, algo que não desejo para ninguém: já perdi os meus cinco vezes, três no supermercado e duas no Centro. Também é muito comum o medo do escuro, especialmente entre as crianças e os monstros que dormem sob as camas delas. Esta aflição, de fato, não passa de bobagem: todo mundo sabe que nada acontece no escuro se você estiver devidamente tampado até a cabeça com a coberta.

Homens e mulheres têm medos específicos. Nós, por exemplo, tememos acordar sem nossos pênis. Elas, por sua vez, temem que acordemos sem nossos carros. Sofremos com a possibilidade do time do coração ser rebaixado – algo, por sinal, só comparável a acordar sem pênis. Nossas companheiras, se afligem com a chance de perder alguma liquidação ou torra-torra – algo como chegar à festa com o “mesmo vestido daquela vaca”.

A vida é assim, um eterno apavorar-se. Mas, vamos lá, prometi que entregaria alguns medos próprios nesta coluna. Chegou o momento. Só peço que tentem esquecer disto tudo até a próxima semana. Tem coluna nova, não retomemos o assunto. Pois bem. Tenho medo de andar na rua à noite, tanto em Araranguá como em Criciúma. Fico olhando para os lados, meio desconfiado. Sinto-me como numa Gotham City sem Batman. Tenho medo de choque elétrico. Levei um forte, numa viagem com o pessoal da faculdade, ao sair da piscina para instalar o notebook na caixa de som – talvez (talvez!) devesse ter me secado com a toalha antes.

Também tenho medo de cobras. Especialmente as humanas, raça extremamente venenosa contra a qual não há soro antiofídico. Tenho medo de atropelar animais. Acho que já atropelei um passarinho – é sério – e já matei um cachorro. Mas este, pelo modo como se atirou na frente do automóvel, era suicida. Também tenho medo de prender os testículos na porta do carro. E de ter um pesadelo erótico com a Preta Gil. Sei lá. Acho até que prefiro acordar sem o pênis...

PS: Agora, com vocês, uma pessoa com medo:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 24 de julho de 2012.

terça-feira, 17 de julho de 2012

O que não fazer na rede social

Por que algumas pessoas compartilham estes momentos?
As redes sociais – fenômeno da internet que nada têm a ver com os leitos balançantes para duas pessoas produzidos em larga escala na Bahia – são um caminho sem volta. Primeiro porque o ser humano, mesmo os exemplares mais escrotos da raça, como você e eu, precisa se relacionar com o próximo. Segundo porque a possibilidade de manter o próximo bem longe é agradabilíssima. Chega do martírio da conversa forçada sobre como vai o tempo na cidade: na internet não se pergunta isto. Chega daquele bom dia que sai coagido às 7h15min da madrugada: ninguém cumprimenta individualmente todos os contatos da rede pela manhã tão cedo – no máximo, uma mensagem em massa. Você sequer precisa se dar ao trabalho de comentar, emitir o seu ponto de vista, quando alguém lhe questiona o que quer que seja: basta curtir para não perder o afeto. Pronto, beleza. Mas o ponto crucial a que quero chegar hoje é: algumas coisas simplesmente não devem ser compartilhadas em redes sociais.

Como algumas fotos. Tudo bem que você foi para a praia no último fim de semana junto com a galera da faculdade, mas expor aquele amigo menos chegado ao ridículo de aparecer com a mão na cintura num momento de distração gay pode acabar com a reputação do garoto na internet. E o que dizer daqueles cliques dentro do banheiro, moças mandando beijinhos e rapazes mostrando peitinhos para o espelho? E o que falar, então, da garota que publica a 354ª fotografia de peito e/ou bunda e se ho-rro-ri-za com os comentários cre-ti-nos daqueles mo-le-ques?

Como algumas ideias. Tudo bem que um dia você pensou em por o gato dentro do forno microondas para ver no que é que dava – e sei de gente que já o fez –, mas divulgar uma ideia em rede social é o mesmo que colocá-la, de fato, em prática. Então cuidado. Algumas pessoas ficam chocadas ao saber o que se passa pelo seu raciocínio. Pense duas vezes antes de dizer que entende os motivos de Hitler, que chegou tarde para a Ku Klux Klan ou que comeria a Wanessa Camargo. E o bebê.

Como alguns comentários. Abelardo Barbosa já dizia: “quem não se comunica, se trumbica”. Mas tem gente que tropeça mesmo é quando abre a boca, benza Deus... E no quesito cambalear no teclado, sem tentar fazer guerra dos sexos, a mulherada lidera com folga. Os assuntos de uma parte – relativamente pequena, mas absurdamente irritante – das mulheres, basicamente, são: “as periguetes que me invejam”, “os homens que estão aos nossos pés, meninas”, “cadê o meu namorado, Santo Antônio?”, “estou solteira por opção”, “só uma dica para você, pirinha”, “só uma dica para você, cafajeste” e “eu quero tchuuuuuuu...”.

Como algumas atividades. Ninguém precisa saber que você vai ao ginecologista. Nem que “desceu”. Ninguém precisa saber que você finalmente vai fazer o exame de toque. Ou que quem vai é o seu pai, coitado. Para que comentar a sua ida ao banho? Para que mencionar a sua prisão de ventre? Para que citar o seu joanete?! Posso estar ficando ranzinza para a internet, mas é demais para mim. Preciso confessar, às vezes até sinto falta daquele bom dia coagido às 7h15min da madrugada...

PS: Agora, com vocês, uma canção pioneira sobre as redes sociais:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 17 de julho de 2012.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Síndrome de pobreza

Ônibus, confesso que ainda gosto. Um pouco
Definitivamente, nasci para ser pobre. É como se minha vida toda tivesse caminhado para a linha da miséria. Como uma pré-disposição ao Bolsa Família, sei lá. Chego a esta constatação no retorno de uma viagem Criciúma-Florianópolis. Primeiro porque chamar de “viagem” uma ida a trabalho para a Capital já dá mostras de que pouco saio de casa. Fica-se duas horas e meia na estrada, mais ou menos o tempo que um paulistano gasta para ir ao serviço. Segundo porque estou num ônibus e, agora me lembro, sempre adorei andar nisto.

Não nasci em berço de ouro, mas também não cheguei a ser gerado numa manjedoura. As contas lá de casa sempre foram fechadas com sacrifício, mas nunca faltou comida na mesa – nossa toalha estampada com frutas às vezes resolvia. A verdade é que nunca passei fome. Só meus pais.

Enfim, quando era menino, pensava que podia ser o que quisesse. E talvez pudesse mesmo, mas a cada novo dia fazemos escolhas, e estas opções involuntariamente afunilam as perspectivas. Ao me descobrir heterossexual já não podia mais ser travesti, por exemplo. Ao não prestar atenção nas aulas de Biologia, já não tinha mais como descobrir a cura de um câncer. E ao prestar vestibular para História e para Jornalismo já não podia ser rico. Mas era algo sem volta: todos os testes vocacionais apontavam para a pindaíba.

O que mais me assusta, neste momento, é lembrar que sempre gostei de andar de ônibus. Me parece que a propensão ao bolso vazio já vinha de antes. Me recordo que a possibilidade de dar uma voltinha num coletivo era caso de muita celebração. Também amava o fato de minha mãe trabalhar numa empresa de ônibus. “Mulher de sorte”, pensava, aos seis. Ela era – e é – tesoureira da companhia. Num primeiro instante, imaginei que seria a minha mãe a responsável por costurar a roupa dos motoristas. Foi decepcionante saber da verdade, mas com o tempo me conformei: de certa forma, como tesoureira, ela também evita que os funcionários andem pelados no começo do mês.

Mas retomando: o fato é que não há o menor motivo para gostar de andar de ônibus – e escrevo esta coluna dentro de um. Em Florianópolis, embarcaram cerca de 25 passageiros. Na fila de poltronas ao lado, uma gordinha trata de manter o peso: não para de fuçar pacotes barulhentos. A roliça já comeu bolacha, chips, Bis e jujuba. Uns cinco bancos à frente, uma mãe tenta, sem sucesso, fazer um bebê parar de chorar. O danado só deu uma pausa no lamento perto do posto policial. Deve ser respeito. Fora este trecho, a gritaria é intensa. Gostaria de encontrar um meio para ajudar a cessar o choro da criança, mas até agora só cogitei o estrangulamento. Sei que nem sempre este tipo de ajuda é bem visto.

Para se abancar nos últimos lugares do ônibus, entraram um jovem senhor e sua companheira, uma adorável senhorita com batom e barba mal feita. Deve ser mais forte do que eu, o elemento, típica pessoa que faria o Ronaldo estremecer. Juro que estou seco por um copinho d’água, mas sussurros e sons de beijo vindos da poltrona final têm me dado calafrios. Entre ficar sentado e saber o que acontece naquele fundo – entenda como quiser –, prefiro a sede.

Paramos em Tubarão, mas pelo visto só desceram as pessoas normais. Faz uns trinta quilômetros que a gordinha dos pacotes dormiu. “Um pouco mais de silêncio”, ponderei. Até que a redonda começou a roncar, virada pro meu lado. Tudo bem, já estamos chegando ao nosso destino, Criciúma. A rodoviária é iminente. A “viagem” está acabando e sinto que me fez bem: gosto um pouco menos de ônibus desde agora. Poderia ser um indício de recusa à pobreza? Quem sabe, pra dizer é cedo e agora é tarde: chegamos à rodoviária, preciso guardar o notebook. Ah, e sabe a gordinha aqui do lado? Acordou. Está abrindo um pacote de bala...

PS: Agora, com vocês, Virgulóides:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 10 de julho de 2012.