terça-feira, 28 de agosto de 2012

Em campanha

- E o seu voto, quanto vale?
Estamos no período eleitoral, época de escolher os próximos enquadrados na Lei da Ficha Limpa. Ou de reeleger os já enquadrados, enfim. É tempo de encontrar santinhos em meio às correspondências – todos infernais. É hora de propaganda eleitoral gratuita e de o povo pagar caro por isso: nossa paciência testada num nível de repulsa elevado à quarta potência. Vezes dois. É a temporada de mudança, de fazer a cidade acordar! Com os carros de som, no caso: impossível dormir num sábado à tarde chuvoso depois daquela semana de batalha.

Não faz sentido, mas eleição eu gostava mesmo quando era criança. A turma se reunia no recreio pra jogar bafo. E nada de soprar o hálito na cara do amigo; não, nada disso. Os colegas sentavam-se no corredor, sobrepunham dois santinhos dobrados um sobre o outro e tentavam volvê-los com a mão levemente curvada em forma de concha, de modo que o primeiro a conseguir fazê-lo ficar-lhe-ia com o material publicitário vinculado àquele homem ou mulher em campanha. Explicando assim até pode parecer difícil, mas, num resumo breve, bastava socar aquelas fuças safadas contra o chão para virar os bagulhos. Simples assim. Tão simples que deve ter caído em desuso – a menos que já aja aplicativo equivalente para o iPad.

Hoje em dia período eleitoral me incomoda. É que não sou chegado a tapinhas nas costas de gente que mal mostra os dentes nos outros três anos e nove meses em que não há campanha. Odeio ser parado por alguém que pede votos sem ao menos ter propostas sérias a apresentar, como se eu fosse entregar a minha opinião final pela súplica, numa espécie de favor ao desconhecido que um dia decidiu me cercar na rua. Ridículo.

Antes que alguém me entenda mal, adianto-me: eleições são necessárias, uma prática indispensável num país que almeja a democracia. Acompanhar a política e todas as movimentações que afetam o nosso cotidiano também deve ser um exercício diário, afinal o dinheiro que você recebe, o dinheiro que você gasta e até mesmo o dinheiro que você deixa guardadinho naquela poupança – um abraço, Collor! – são afetados pelas decisões destes representantes públicos. O que me irrita, mesmo, é o período eleitoral.

Me incomoda empresário que não valoriza os próprios empregados abraçando pobre. Me azeda ver gente vendendo voto por tijolo, consulta no dentista ou gasolina. Ou pior, escolhendo este ou aquele porque é “daquele partido”, sem ao menos saber quais ideias tal candidato tem. Me deixa indignado ver senador e deputado conseguindo trabalhar menos ainda, fazendo inveja até em turista, empenhados em campanha. E o que mais me tira do sério mesmo é o horário político no rádio e na televisão.

Propaganda eleitoral gratuita é uma piada. Cada um pinta a vida maravilhosa que lhe parece melhor. É que nem Facebook: a gente só divulga o que vale a pena. E as juras? Somos bombardeados por promessas impossíveis, sem qualquer embasamento ou planejamento. É, simplesmente, terrível. Penso que a melhor forma de se conhecer – um pouco – cada candidato é através dos debates, mas estes acontecem à míngua. E o povo acaba votando ou pelo partido, ou pelo tijolo ou pelo mínimo conhecimento que se tem da trajetória política do pretendente ao cargo – noção que a propaganda obrigatória não ajuda a construir. Então como se escolhe um candidato? Com aquele exercício diário, claro. O problema é que no Brasil há pouca gente em forma e muito sedentário digitando o “confirma” nas urnas. Assim não dá, assim não pode.

PS: Agora, com vocês, uma verdade inconveniente:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 28 de agosto de 2012.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Agora é no Rio

Renato Sorriso nas Olimpíadas, para a tristeza de muitos
Os Jogos Olímpicos de Londres acabaram domingo deixando algumas lições importantes. Primeira: jamais brinque de “quem chegar por último é a mulher do padre” com Usain Bolt – pelo menos não sem antes escolher o vestido. Segunda: errar é o Mano, mas repetir o mesmo erro na Copa América, nas Olimpíadas e ainda cogitá-lo para a Copa do Mundo é CBF. Terceira: navegar é preciso; investir em esporte, também.

Sorriso, Ambrósio, Jorge: Brazilian Day em Londres
O Brasil conseguiu o seu maior número de medalhas em uma edição olímpica, fato a ser celebrado. Mas ainda é pouco, muito pouco, para uma nação do nosso porte e com nosso talento. Eu mesmo poderia ter sido um grande nadador ou jogador de vôlei, mas creio que careceu investimento: me faltaram oportunidades, aptidão e uns 20 centímetros.

Analisando o cenário, teríamos condições claras de figurar – no mínimo – entre os dez primeiros colocados no quadro geral de medalhas. Terminamos em 22º, o que não é vergonha: ainda que nossos atletas fiquem a míngua enquanto alguns poucos cartolas estufam contas bancárias em paraísos fiscais, resultados expressivos foram conquistados. E conquistados na base da luta, suor e sofrimento diário, enquanto um enorme grupo de sedentários – como você e eu – criticava os seus sétimos, quartos e até mesmo terceiros lugares dentro da elite mundial sem nunca ter ganhado uma medalha de Jasc sequer.

Bem, agora os jogos são aqui. E o que esperar de uma Olimpíada num país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza como o nosso? Além de superfaturamento em obras, filas em aeroportos e preços abusivos, digo. Incógnita total: há um medo geral de que o Brasil faça um fiasco. Uma preocupação insistente de que, em vez de welcome, recepcionemos o mundo com faixas hands up, playboy! É esperar para ver.

Pois um dos momentos mais aguardados do encerramento oficial das Olimpíadas de Londres era justamente aquele em que o Brasil mostraria o seu cartão de entrada para 2016. E nada de Visa ou MasterCard: tratava-se de uma rápida apresentação de traços marcantes de nosso país. Eis que surge Renato Sorriso no meio da galera, para delírio da classe operária e das madames do Leblon – cada um a seu modo, é claro. E eis que os problemas já começam.

Há quem tenha amado. Há quem tenha achado vergonhoso. Fato é que ninguém ficou indiferente à apresentação brasileira no último dia dos jogos londrinos. Consta que Boris Casoy teria repetido “isto é uma vergonha” dez vezes em frente ao espelho. As Empreguetes teriam a-ma-do. Luana Piovani teria entrado em colapso e xingado todo mundo no Twitter – um dia como outro qualquer, enfim.

Sou da parte que gostou. Acredito que não poderia haver melhor representante da nossa alegria que Renato Sorriso. A principal riqueza que o país tem é o seu povo, que batalha todo dia dando duro e ainda consegue sorrir, apesar das dificuldades. O.k., parte dos críticos só não gostou da encenação de “barrá-lo”, algo “vexatório para o Brasil”. E se fosse um gari inglês? Será que o momento não seria encarado apenas como uma encenação – que, de fato, era? E quem reclamou das músicas, esperar o quê? Sinatra? Mozart?!

A coreógrafa comentou que neste momento os chavões seriam inevitáveis, já que deveria trabalhar com figuras de fácil compreensão mundial – como o samba e o calçadão de Ipanema. Teve até gente que questionou a “excessiva” referência à cultura carioca, ignorando totalmente que as Olimpíadas, de fato, são no Rio de Janeiro e acontecem tão somente lá. E a pergunta continua: o que esperar dos jogos aqui? Não sei. Já não sei mais nem o que dizer sobre a parte pobre – de espírito – da nossa gente.

PS: Agora, com vocês, Jorge Ben:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 14 de agosto de 2012.