terça-feira, 19 de junho de 2012

Me acordem daqui a três meses...

- Não está fácil pra ninguém, companheiro...
O friozinho está chegando, anunciando a chegada do inverno. E inverno que é inverno tem cara de dieta. De engorda. É feijoada, rabada, tainha assada, tutu, farofa de pinhão, camarão na moranga, macarrão ao alho e óleo, fondue, lasanha, chocolate quente, rodízio de pizzas e massas, churrasco, brigadeiro na panela, mingau, sopa com caldo gordo. Se você ficou com água na boca só de ler a última frase, percebe-se que tem uma pré-disposição natural a estourar o botão da calça jeans durante a estação mais fria do ano. Calma, gordinha. Calma.

Tem gente que gosta do inverno. Tem quem diga que é por causa das roupas, seria uma estação mais chique, mais europeia. Bobagem. O que me comove mesmo é fio dental na areia e sunga branca no calçadão da praia – cada um à sua forma, veneração e asco. Há quem diga que as festas são melhores. Serranos, de modo geral. Balela. Congelar em Lages para conseguir um punhado de pinhão não me faz a cabeça. E quentão me dá gases. Eu acho.

Mas o quente do inverno mesmo é o frio. Volta e meia alguém sai com essa, de preferir o inverno porque “gosta de curtir o friozinho”. Não posso com isso, juro. Mas como? Curtir friozinho embaixo de quatro cobertores, na frente da lareira, do lado do fogão a lenha?! Isso não é curtir frio, é matar saudade do calor!

Mas, vá lá, o inverno trás coisas muito agradáveis também. Como a gripe. Claro, nada melhor que um pouco de febre, coriza e inflamação na garganta para pegar umas folgas forçadas sem ter que mentir no atestado médico. Aliás, repouso é praticamente a única coisa que se faz na cama durante os dias gélidos da estação mais glacial do ano. Até porque tirar a roupa é sempre um parto e nem sempre é fácil equilibrar as cobertas... mas mudemos de assunto, já que talvez ainda não tenha passado das 22 horas durante a sua leitura.

Se ainda não deu para perceber, tenho pavor de inverno. Tudo fica mais difícil. Você trabalha completamente encasacado e mal pode se mover na mesa. As inseparáveis luvas são péssimas companheiras na hora de digitar qualquer coisa no computador e, por mais que se esquentem as mãos, aquela que fica no mouse voltará ao ponto de gelo em cerca de um minuto e trinta segundos. Levantar da cama é um drama. Tomar banho é um drama. Respirar na rua é um drama. Viver é um drama! A única atividade que não vira um drama no inverno é a atividade física. Mas esta já é um drama o ano todo...

Agora o que mais me incomoda, entre tudo o que me incomoda no inverno, é a maldita afirmação de que o frio é psicológico. Não sei quem foi o infeliz inventor desta besteira, mas, honestamente, espero que tenha tido uma morte lenta – isto porque não sou de guardar mágoas. Olha, se o frio é mesmo psicológico, eu devo ter sérios problemas mentais. Mas me conformaria com alguma psiquiatra quente. Que goste de curtir o friozinho, claro.

PS: Agora, com vocês, Djavan, é claro:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 19 de junho de 2012.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Um namoro para hoje

Senhorita Nicolete e eu. Te amo, Potchoco!
No Carnaval, brotam da terra solteiros fazendo piadinhas com quem namora alguém. É o tipo de gente que adora soltar algum comentário cretino por, teoricamente, estar livre e desimpedido para encher a cara e pegar a pessoa mais escrota da folia. Pois chegou a hora da desforra, comprometidos.

Hoje os engraçadinhos sumiram. Talvez seja vergonha, pelo fato de andarem fora da nova tendência da estação, que recomenda o uso de cobertores de orelha em casa ou na rua. Nos diz a Bíblia: “Bem-aventurados os que podem andar agasalhados, porque deles é o reino do sofá”. Ou quase isso. O fato é que namorar está na moda.

Mas tem que ser namoro sério, daquele com planejamento. Nem que seja pro fim de semana, o que for. Namorar sem perspectiva é como ficar numa balada. Você até troca uma ideia e uma saliva, mas não sabe se no outro dia realmente vai ter alguém do seu lado pra dividir o café da manhã e os problemas. Ou se vai ter alguém com que possa disputar quem desliga o telefone primeiro. Simplesmente, não dá.

É por isso que, quando namoro, é pra casar. Sempre tive esta postura. Sempre. Foi assim com as minhas cento e trinta e duas namoradas. Mas relacionamentos nem sempre dão certo, como bem se pode ver... O.k., não tive tantos relacionamentos amorosos e casamento, para mim, era tabu. Mas sabe quando o problema não são as outras pessoas, o problema é você? Pois é, aqui o problema eram as outras pessoas mesmo... Faltava encontrar aquele certo alguém que desperta o sentimento. Encontrei. Agora me pego volta e meia esquematizando esta coisa antiquada de filhos, casa com cachorro no quintal. Um “felizes para sempre” suburbano. Planejamento, é preciso planejamento!

Acredito que a melhor parte do namoro é a parceria. É ter a certeza de que alguém estará sóbrio para dirigir o carro depois da festa. É ter ao lado uma pessoa que pergunte como foi o seu dia, todo o dia. É poder dividir a raiva na hora em que o despertador toca às 6h30min. É poder dividir a alegria na hora em que você se lembra que é domingo. É saber que mais alguém está fulo da vida por você ter que trabalhar outra vez naquele feriado santo dos tapetes. Todo ano.

Namorar jornalista não é fácil. Geralmente estamos sem tempo pra ter tempo. A Polícia Militar te liga de madrugada. A Páscoa em família é interrompida por desastres aéreos. As folgas são escassas. As férias não têm previsão. Não há muito dinheiro pra sair e, quando se consegue pegar a estrada, sempre existe a possibilidade de algum criminoso decidir matar alguém em pleno fim de semana – que deselegante! Por aguentar tudo isso, congratulo a companheira que eu amo, a minha amiga e a minha amante. Todas as três. E antes que algum desavisado imagine bobagem, explico: a minha namorada é como a Santíssima Trindade. É três em um, a danada.

Se você ainda está solteiro por opção – dos outros –, imagino que adoraria ter um namoro para hoje. Mas não force a barra. Até porque é como dizem: o segredo é não correr atrás das borboletas. É embriagá-las. Ou quase isso.

PS: Agora, com vocês, Legião Urbana:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 12 de junho de 2012.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Joelhos, crianças e fraldas descartáveis

O milorde das fraldas, João Nicolete Bernardo
Domingo aconteceu o batizado do meu afilhado João Bernardo. Havia umas quinze crianças na igreja, mas no grupo apenas três meninos – o que indica um futuro promissor aos garotos. Meu afilhado, um milorde das fraldas, estava impecável. Do alto de seus sete quilos e trezentos gramas, prestava atenção a todos os movimentos da missa religiosamente. Pode até parecer prematuro, coisa de dindo, como se diz no Sul, mas a mim não restam dúvidas de que este sim vai ser um católico fervoroso: não o vi pronunciar uma palavra durante as duas horas de celebração.

João, filho da irmã da minha namorada e do seu marido – espera-se –, virou o encanto da família. Tem apenas quatro meses, mas é praticamente uma celebridade: até quando está dormindo vira o centro das atenções, numa infinidade de flashes para a posteridade. Na minha época, o comum era que os bebês tivessem álbuns de fotografia. João, não. João já tem um book, algo que só fui conhecer na primeira aula de inglês on the table. Os tempos são outros. Sinto-me ultrapassado. É como se um dia o moleque fosse me apresentar as fotos digitais antigas num tablet e eu, em contrapartida, fosse buscar as minhas xilogravuras...

Impressionante como tudo mudou desde quando eu era bebê. Nos meus tempos idos de guri, fralda descartável era artigo de luxo, muito luxo. O jeito era lavar no braço, no tanque – ou cocho, se você fosse do campo. Presente era só em data muito, muito importante, como em dia de aniversário ou Natal, e com um pouco de sorte. Sério: no meu segundo ou terceiro ano de vida, meus pais simplesmente não me contaram que no dia 29 de abril era meu aniversário, já que não tinham dinheiro pra comprar um presente. Pode parecer uma estratégia pouco nobre, mas até que me fez bem: obrigou-me a compreender o calendário o quanto antes.

Apesar das inevitáveis mudanças que promove o passar das décadas, certas coisas nunca mudam com o tempo. Continuamos a achar os bebês atuais mais espertos que os de antigamente, menosprezando a nossa própria astúcia. Ainda usamos aquela voz de Xuxa com cólica para nos comunicar com as crianças. Repetimos os mesmos gestos, incansavelmente, quando descobrimos alguma expressão que os faça soltar um sorrisinho de canto de boca que seja. Ficamos sensivelmente tocados por aquele cheirinho, aquela fragrância de bebê que só poderia mesmo sair de um ser com tão poucas glândulas sudoríparas. E babamos, bem mais do que eles conseguem babar com a mão na boca, por qualquer movimento ou façanha nova recém-aprendida.

Que os bebês são lindos não há dúvidas, mas isso vem com o tempo. Não importa o que se diga, aos olhos de um homem normal todo recém-nascido sai com cara de joelho. Ali há uma boca e um nariz, dois olhos e duas orelhas, mas, sim, é um joelho. Talvez a falta de sensibilidade se deva somente à falta da paternidade, condição que, de modo geral, amolece até os mais xucros. Sem filhos, ainda estou na fase da grossura. Mas acho até que poderia ser um pai divertido, desses que jogam bola pela casa infernizando mães... Por falar em mãe, a dos meus filhos eu já escolhi, um passo importante. Agora só falta a permissão do padre, a casa e o joelho. E fraldas descartáveis, por favor.

PS: Agora, com vocês, Trem da Alegria:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 5 de junho de 2012.