terça-feira, 22 de novembro de 2011

A popularização do automóvel

Dia do fatídico comentário: Prates prestes a perder emprego
Hoje qualquer miserável tem um carro; logo, eu tenho um carro. A primeira parte da frase foi dita por Luiz Carlos Prates em um afamado comentário que culminou com a saída dele do Grupo RBS – perdeu os empregos, de uma só vez, no Diário Catarinense e no Jornal do Almoço, o ladino. Hoje o jornalista faz seus comentários no SBT e, dizem, vende Tele Sena nas horas vagas.

De certa forma, compreendo o que Prates tentou – com insucesso – dizer. Primeiro: a popularização do automóvel contribui para – dã – o aumento de número de carros e, consequentemente, a quantidade de acidentes; segundo: pessoas frustradas, para amenizar suas frustrações, compram carros mais potentes; terceiro: acho que mulheres preferem chocolates mais potentes a carros mais potentes (opinião minha); quarto: homem que “necessita” de carro grande tem pinto pequeno; quinto: eu necessito apenas de um Gurgel.

Ex-deputado Fernando: com ele, está tudo em Ribas
Um pouco disto tudo já daria uma receita complicada, mas a omelete desandou de vez quando Prates insinuou que o governo não deveria ter facilitado tanto o acesso a automóveis para a população menos favorecida economicamente – vulgos pobres – e que veículos estavam sendo guiados por pessoas que jamais leram livros e que, por este motivo, não deveriam dirigir... Na minha opinião, respeitar uma placa de 80 km/h não tem ligação com ser culto; tem ligação com ser honesto, ter responsabilidade, bom senso. Livros, de modo geral, não ensinam isto. Será que o ex-deputado Fernando Ribas Carli Filho, que matou dois jovens ao colidir contra o carro deles embriagado, a mais de 160 km/h, jamais leu um livro? Pelo acidente, segundo a teoria de Prates, ele deveria ser, no mínimo, neandertal.

A popularização do automóvel é um problema? Se o trânsito nas cidades não for repensando para acomodar todos os veículos, sim. Mas o que gostaria de tratar agora, e dei voltas e voltas para chegar até aqui, é sobre outro problema que a popularização do automóvel trouxe consigo: os motoristas com bracinho na janela.

Esta categoria de condutores costuma andar, lentamente, pelas áreas centrais e mais povoadas das cidades. Quase nunca, de modo geral, olham para frente: seus olhares estão fixos nas calçadas, à procura de pessoas que possam estar acompanhando suas passagens. Outra característica marcante do grupo é que os motoristas com bracinho na janela estão sempre acompanhados de mais um ou até de mais quatro colegas, todos homens. O resultado do passeio é que nem na Bahia existe tanto coco por metro quadrado.

Os Prestígios, apelido carinhoso dado aos automóveis guiados pelos motoristas com bracinho na janela, só ficam completos, claro, com som – ou barulho, como queira. Não raro, os equipamentos sonoros custam mais do que o restante do veículo. Mais comum ainda: as músicas são péssimas. A trilha sonora da vida de um motorista com bracinho na janela costuma ser aquela que você só tolera no quarto dia de Carnaval a dois goles de um coma alcoólico. Quando há letra, algo totalmente opcional nas canções (?!), a poesia pode tentar te motivar a: A) Beijar na boca. B) Beijar na boca e fazer sexo. C) Beijar na boca, fazer sexo e beber. D) Dançar kuduro.

Ouso a dizer que o maior problema da popularização do automóvel é a epidemia de motoristas com bracinho na janela. Cientistas britânicos descobriram que um quarto do gás carbônico despejado na atmosfera poderia ser evitado caso estes condutores não passassem tantas vezes seguidas pelo Calçadão da sua cidade. Cientistas chineses acreditam que a extinção desta categoria de proprietários de veículos poria fim ao kuduro. E ao Latino. Cientistas tailandeses, por sua vez, estão prestes a divulgar um revelador estudo sobre o grupo, mas pararam os trabalhos para a hora da massagem. Há quatro meses. Já os norte-americanos, empenhados no tema, ligaram à existência dos motoristas com bracinho na janela a um grupo específico de mulheres que receberam provisoriamente o nome de latino-americanas piriguetes, termo ainda sem tradução, mas que, acredita-se, seja algo como “Marias Gasolina”. Por sorte, o governo brasileiro já se adiantou e tenta acabar com a praga: a partir de 2012, só serão permitidas no país “Marias Biodiesel”.

PS: Agora, com vocês, kuduro na voz marcante de Latino...



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 22 de novembro de 2011.

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