terça-feira, 22 de maio de 2012

Bodas de Brilhante

Amor verdadeiro nem Alzheimer apaga!
Sábado, ao meio-dia, eu tive a felicidade de acompanhar uma festa de Bodas de Brilhante. O casal, o seu Pedro e a dona Doda, comemorava 75 anos de matrimônio. Exatamente: 75 anos. Familiares próximos estavam receosos em organizar a celebração. O medo era geral, por motivos óbvios: corria à boca miúda que o casamento daqueles dois podia não vingar. Mas, pelo menos até a festa, ocorreu tudo bem na relação.

Difícil mesmo foi comprar o presente. A dúvida era justamente o que dar a um casal que completava 75 anos de casamento. Minha namorada e eu prejulgamos que, neste meio tempo, os dois já haviam conseguido completar o enxoval. Na dúvida, uma neta ajudou com alguns toques. Problema resolvido, fomos à festa.

Como toda noiva que se preze, dona Doda era só sorrisos. Já seu Pedro, como não poderia deixar de ser, estava com aquele compreensível olhar de quem entrou para a forca há 75 anos. Nada mais natural. Enquanto recebia os convidados, a mulher gabava-se de que os pombinhos jamais brigaram durante o casamento. Seu Pedro não contestava a esposa, o que, de certa forma, também explica o saldo.

A celebração foi muito bonita, com alguns familiares agradecendo pelo convívio com o casal. Um diácono – um quase padre, digamos – foi quem conduziu a benção das Bodas de Brilhante. Para espanto geral, ele não repassou nenhuma dica aos noivos, o que, entendia-se, poderia prolongar a união por mais tempo. Mas ainda assim, deixo aqui registrado o desejo de que este matrimônio dê certo, afinal.

Terminada a celebração, corri para a calculadora e descobri que o casamento do seu Pedro e da dona Doda aconteceu em 1937. Para se ter uma ideia, meus avós não haviam nascido. O presidente era o futuro suicida Getúlio Vargas. O Papa era Pio XI – já passaram seis depois dele. A moeda corrente era o mil-réis. O Fusca era apenas um protótipo, com 30 modelos fabricados. Não havia Miss Brasil. A seleção só ganharia uma Copa do Mundo 19 anos depois. Dercy Gonçalves era gostosa. O Ermo não existia.

O seu Pedro e a dona Dona tiveram quatro filhos. Pouco, relativamente, já que o padre deu a benção e liberou a festa há 75 anos. Pelos meus cálculos, dá para repetir o Kama Sutra 312 vezes neste meio tempo – a estimativa desconsiderou as supostas dores de cabeça da dona Doda e, obviamente, “aqueles” dias. Na média, o casal teve um novo filho a cada 18 anos e nove meses, o que demonstra certa prudência: antes do primeiro ano de faculdade quitado, nada de abandonar a tabelinha.

A expectativa de vida está cada vez mais alta, mas hoje casa-se cada vez mais tarde; por isso, penso ser difícil, atualmente, atingir a marca do seu Pedro e da dona Doda. De todo modo, o que fica de lição é que o casamento, instituição por vezes dada como falida, pode perdurar por muitos anos quando existe respeito, quando existe cumplicidade e quando o marido não contesta a mulher. Se continuar neste ritmo, tenho certeza de que o seu Pedro e a dona Doda ainda vão muito mais longe. Sei lá, Bodas de Oscar Niemeyer, talvez. Mas já estão de parabéns.

PS: Agora, com vocês, um tributo ao amor:



Texto publicado na coluna “Devaneios” do jornal Sem Censura em 22 de maio de 2012.

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